O Caminho do Zazen (Shodo Harada Roshi)




A cada ano quando o mês de dezembro se aproxima, monges de vários locais ficam ansiosos com a chegada do rohatsu osesshin. Nos dojos Zen, todos intensificam suas energias no preparo do osesshin, que ocorre dos dias 1º a 8 de dezembro. O rohatsu osesshin é a consumação de um ano de treinamento, o tempo em que cada um avalia o seu ano de prática.
A iluminação de Buda aconteceu em 8 de dezembro, quando olhou para a estrela da manhã, conhecida por nós como planeta Vênus. O brilho do planeta foi visto por Buda profundamente na semana do samadhi. Buda recebeu aquela luz com os mesmos olhos do zazen, capazes de nos mostrar a perfeita iluminação.
Uma semana íntegra do mais profundo samadhi foi rompida repentinamente pela irradiação da estrela da manhã. Toda experiência de uma semana de completa morte espiritual, a grande morte, o estado mental da existência que ultrapassa a morte. Neste mundo eclodiu o brilho da estrela da manhã, mergulhando nos olhos do Buda e fazendo renascer sua consciência. .
Ele clamou:
É isso! É isso! É isso! Sou eu que estou iluminando magnificamente!
Quanto mais profundamente era movido, mais maravilhosamente se sentia. Desta experiência surgiu o Dharma de Buda. Sobre estar neste estado da mente Buda disse:
Que maravilhoso, que maravilhoso! Todas as coisas são providas desta pura natureza! Que acontecimento esplêndido e surpreendente foi realizado! Todos os dez mil objetos, todas as flores, todas as árvores, todas as rochas e tudo em qualquer local estão iluminando deslumbrantemente! Que impressionante! É a mesma paisagem, mas como esplendidamente está iluminada! Que frescor em tudo!
Desta profunda iluminação a janela de Buda nasceu. A origem do Zen vem deste estado de consciência de Buda.
As pessoas fazem votos de vivenciar esta mesma experiência de Buda no rohatsu osesshin. Em cada dojo Zen pessoas entregam suas vidas para serem capazes de experimentar exatamente o mesmo estado da mente que Buda obteve neste 8 de dezembro. Este é o firme propósito de todos que participam de um rohatsu osesshin.
Há um registro dos ensinamentos de Hakuin Zenji chamado Rohatsu Jisshu. É uma coleção de ensinamentos ministrados a cada noite na semana do rohatsu osesshin. Hakuin Zenji ensinou a partir de sua própria vivência, para encorajar seus discípulos e lhes dar energia para a prática. Esta coleção de ensinamentos é o trabalho de Torei Zenji, discipulo de Hakuin. Não está disponível ao público em geral e é apenas aplicado em zendos pelos monges, devido à sua severidade e rigidez. Neste texto, encontraremos o caminho do zazen, o modo de chegar ao samadhi, e a forma de respirar (susokkan). Foram descritos com grandes detalhes.
Gostaria de comentar os ensinamentos de Hakuin Zenji usando o texto Rohatsu Jisshu, mas acrescentando minhas experiências pessoais com a esperança que auxilie na pratica de cada individuo.
Começaremos usando o texto de Hakuin da primeira noite do rohatsu osesshin. Ele falou a vários discípulos que se dispunham em sua frente, assim:
Para aquele que deseja chegar ao intenso samadhi, a melhor forma é se sentar sobre uma almofada alta, sentar-se em lotus completo e vestir trajes folgados. Mantenha sua coluna ereta e sua postura alinhada, todavia confortável. Inicie realizando o susokkan, o melhor modo possível de atingir o completo samadhi, focando em seu ki em seu tanden. Então, concentre-se intensamente em seu koan até romper com as raízes da atenção em sua autoconsciência completamente. Se você continuar a praticar o zazen dia após dia, kensho será realizado com a mesma certeza de estar sobre o chão em que pisa.. Entre de cabeça nisto, usando toda sua energia.
Samadhi profundo!Samadhi profundo! Todos teorizam sobre o kensho, porém se não desenvolvermos nosso próprio samadhi através da prática, não adianta “inventar” seu samadhii, pois ele se tornará mais distante que o céu.
O Sexto Patriarca e Rinzai Zenji ensinaram que apenas o kensho foi de grande importância e que o samadhi e a libertação não devem ser considerados como problemas. Disseram que devemos nos preocupar apenas com o kensho e que somente isso é necessário; visto que, a iluminação é o que importa e o ponto essencial do Zen.
A experiência de Buda foi uma iluminação intensa. Quando viu a estrela da manhã, vivenciou sua verdadeira natureza claramente. Sem isso, não há Zen ou Buddhadharma. Entretanto, apenas dizer o kensho não significa que pode fazê-lo.
Esta não é um era de clareza espiritual. São tempos de turbilhões de informações em todas as partes da sociedade e sua vida diária é complicada e confusa. Temos muita dificuldade de vivenciar nossos sentimentos profundamente. Se nossas mentes não se tornarem verdadeiramente purificadas e lúcidas, o kensho não será possível. Se nossas antenas estiverem completamente cobertas de bolor, não importa quantos sinais se aproximem que não poderão ser captados. Se seu espelho não for claro, não adianta o cenário ser lindo, que não será refletido. O problema é o quanto nossas mentes estão puras e livres. Somente mentes claras e puras podem receber estes sinais.
Isso não significa que devamos produzir um mundo silencioso próprio. A meta é atingir a verdadeira natureza. Para isso, precisamos do Samadhi profundo. Por isso, as pessoas precisam treinar constantemente sua concentração no zazen e empregar a mente da prática na base de sua vida diária e em todas as atividades.
Hakuin começou sua palestra:
Para aqueles que desejam chegar ao samadhi intenso.
O Sexto Patriarca nos deu uma definição concisa do samadhi :
Separar-se de todos os estímulos externos e não ser perturbados por eles.
Quando olhamos ao redor, vemos árvores, flores, montanhas e pessoas e não podemos apagar estas cenas. Não podemos apagar coisas que apareceram antes de nós. Não podemos fechar nossas orelhas e deixar de sentir muitas coisas – calor, frios, alegria e dor — e até mesmo de cheirar fragrâncias. Deste modo, viveremos totalmente conectados com o ambiente que nos circunda e não poderemos nos separar dele.
O fator mais importante é não estar anexado ao ambiente. O que não significa cobrir os olhos, tapar as orelhas ou o nariz nem parar de sentir. Significa que nossas mentes precisam estar retas e concentradas, fora do alcance destes estímulos. Devemos não nos distrair e não usar nossas mentes em vão. Precisamos manter a atenção plena. Significa encontrar nosso centro e com total concentração apanhar nossa energia de forma focada.
Não estar indissolúvel das formas externas, não estar confuso, não pensar nisto ou naquilo, não estar iludido com estímulos exteriores, não se fixar em ganhos ou perdas e se está feliz ou triste. Isto pode ser chamado de Zen. Sempre pensamos em algo. Se permitirmos deixar nossa mente repleta destes pensamentos, nunca se tornará clara. Por outro lado, também não podemos instruir nossas mentes para parar de pensar. O que significa que devemos sempre manter nossas mentes em atenção plena.
Hakuin nos deu instrução para o susokkan, o qual tem a grande função de purificar a mente. Ele disse:
De forma alguma estejamos fixados ao mundo externo e, quando interiorizados em nossas mentes, não pensemos nisto ou naquilo. Tenhamos nossas mentes precisamente concentradas apenas no que estamos fazendo, é o que se denomina de samadhi profundo.
Como Hakuin instruiu:
Para aqueles que desejam entrar em samadhi profundo, a melhor forma é sentar em almofadas altas e usar roupas folgadas.
Para quem almeja chegar ao samadhi profundo, uma almofada alta é melhor. Para quem irá apenas se sentar por dez a trinta minutos, uma almofada alta não é imprescindível. Contudo, aqui em Sogenji podemos nos sentar por períodos prolongados como doze horas e se continuarmos assim durante uma semana de osesshin, um cochim fino poderá ser insuficiente. Deste modo, é aconselhável uma almofada elevada.
Ponha suas pernas em lótus completo. No zazen, há as posições de meio lótus e de lótus completo. Se a execução for possível, é preferível o lótus completo. Acondicione suas pernas cuidadosamente e as dobre bem, tocando os joelhos no solo. É melhor, porque suas pernas não se moverão da posição correta. Na posição de meio lótus, é mais fácil sentir dores nas pernas. Se você se sentar por um longo período de tempo, pode sentir desconforto em suas pernas e querer as mover. Se mover suas pernas, perderá a retidão do eixo central de seu corpo. Se ficar torto por um período longo, perderá seu equilíbrio. Em casos extremos, suas pernas se tornarão e permanecerão insensíveis. Consequentemente poderá ser impossível mesmo fazer o zazen. Isso ocorre porque as pessoas não acomodam bem e nem com cuidado suas pernas na postura certa. Quando as coloca na posição adequada, pode até sentir dor no inicio. O zazen é uma forma de yoga e você não pode ir contra sua estrutura muscular. Se quiser se sentar de um jeito que suas pernas não irão contra sua estrutura muscular, precisa dobrá-las bem. Acondicionar suas pernas de forma frouxa não funciona; elas devem estar tão fletidas quanto suas coxa permitirem. Expanda seu abdome inferior (tanden) tão distante quanto possível e sente-se com suas mãos em frente ao seu abdome, uma em cima da outra com os polegares se tocando.
É preferível se sentar com roupas frouxas. Se você comprimir seu corpo de alguma forma, sua respiração se tornará difícil. Pessoas que usam cintos apertados ou calcas justas precisam afrouxá-las o tanto quanto possível. Endireite sua coluna vertebral e estique-a em direção ao céu. Uma linha entre seus joelhos formará um lado de um triângulo eqüilátero. Ponha sua pelve no ângulo oposto do triângulo e alongue sua coluna a partir deste ponto. Deste modo sua espinha ficará ereta e em seu topo ficarão seu pescoço e cabeça. Assim tornará sua coluna ereta e acomodará a cabeça e pescoço no topo. Encolha seu queixo e puxe o topo de sua cabeça rumo ao céu. Sua cabeça ficará mais leve e terá mais equilíbrio. Se sentar-se deste modo, com a coluna alongada, seu abdome naturalmente será projetado e moverá para frente.
Hakuin instruiu mais, dizendo:
Deixe sua coluna em linha reta e sua postura ereta, porém confortável.
Esta é a melhor maneira de se sentar. Pessoas que lhe vêem fazendo zazen devem singelamente ter uma sensação vivaz e estimulante. Se estirar-se muito, parecerá desconfortável. Se der ao seu observador a impressão de desequilíbrio ou incõmodo, significa que sua postura não é correta. As pessoas que lhe observam devem sentir vibração e revigoramento.
Hakuin orientou seus discípulos falando:
Comecem pelo susokkan, a melhor maneira possível de obter o samadhi profundo, focando seu ki em seu tanden.
Essas palavras vêm da própria experiência de Hakuin. Como o susokkan de Hakuin é um modo de respiração com o tanden, é a mesma forma de respirar ensinada pelo Buda. Claro que Hakuin não foi o primeiro a descobrir isso! Na Índia, de tempos remotos até atualmente, esta respiração tem sido usada. Na prática do Zen, o susokkan nunca foi enfatizado. Considerado como algo óbvio, não acreditavam deveria ser ensinado.
Por treinar de modo extenuante, Hakuin teve problemas em seu sistema nervoso autônomo simpático. Seu ki ficava no tórax, entre seus ombros, fazendo com que se sentisse emocionalmente instável. Ele descobriu que praticando o susokkan poderia assentar sua mente e desenvolver o ki. Ele ensinou o susokkan dos iniciantes aos praticantes antigos. Este susokkan precisa ser bem aprimorado.
Então Hakuin ensinou:
Comece fazendo susokkan, a melhor forma possível de conseguir o samadhi profundo, focando seu ki em seu tanden.
Ele fez com isso parecesse simples, entretanto, há muitos tipos de samadhi. No yoga há muitas formas de entrar no Samadhi sendo o sussokan a melhor de todas. Hakuin nos ensinou isto de sua própria vivência.
A qualquer um que venha ao monastério de Sogenji é ensinado o susokkan como base de sua prática. Para aqueles que usam o susokkan como rotina na vida cotidiana, ele se torna algo natural. Pode-se, contudo, facilmente se esquecer da forma correta do susokkan Por isso é sempre bom revisar sua técnica com repetição e consciência
Inicie o susokkan como eu já expliquei:
Primeiro analise sua postura de zazen. Então, se ela estiver correta remova todas as tensões e estique sua coluna em direção ao céu. Elimine todas as tensões da musculatura de seu pescoço e de seus braços.
Quando fizer isso, se parecerá com aqueles esqueletos expostos na sala de aula de ciências, amarrados pela cabeça com o corpo oscilando frouxamente.
Esta é uma posição relaxada.
Exale quietamente, levando sua concentração na exalação de seu tanden.
Seu tanden é o local que fica a uma polegada e meia abaixo de seu umbigo. Pode sentir se o pressionar. Aqui está o principal centro do sistema nervoso simpático. A fonte do ki humano pode ser encontrado aqui. Se trabalhar com este local, conscientemente seu ki se tornará totalmente aprimorado.
Se não centrar em seu tanden, sua energia reduzirá facilmente e seu ki subirá para região do tórax, entre seus ombros. Isso pode continuar para a musculatura do pescoço e sua cabeça ficará tensa e dolorida. Finalmente, pode se sentir confuso, excitado e começar a chorar sem razão, achando difícil ficar tranqüilo. Se isso acontecer, seu corpo terá tremores. Pelo distúrbio do sistema nervoso simpático, poderá se tornar neurótico. Susokkan é a melhor técnica de manter o ki no baixo ventre.
Relaxando todas as contraturas de seu corpo:
Foque no abdome inferior, como se constantemente soprasse o ar deste local. Encolhendo sua barriga, exale sem ruídos.
Exale o mais prolongado possível, exaurindo completamente o ar até sua barriga ficar plana.
Quando seu fôlego chegar ao final, naturalmente, sem forçar, a inalação iniciará e seu abdome vai encher e se expandir em sua frente. Conforme sua barriga aumenta, sua inspiração ocorre sem esforço. Não é necessário puxar o ar.
Muito confortavelmente:
Foque na expiração completa.
Conforme seu abdome se expande:
Inspire consequentemente.
É como um conta-gotas. Há um bulbo de borracha na ponta de um tubo de vidro. Ao pressionar o bulbo, o ar sai. Quando o solta, a água é sugada para o tubo. É como o conta-gotas funciona. Do mesmo modo, achatando sua barriga completamente na exalação do ar, a entrada do ar de fora acontecerá como a água no conta-gotas: o ar flui simplesmente.
Quando acabar a exalação, seu abdome naturalmente encherá de novo e com esta ação você inala. Não puxe o ar. Se fizer isto, quase não haverá tensão em seus ombros e o ar virá facilmente. Em um curto espaço de tempo, ar suficiente será inalado com facilidade.
Se você se tornar muito tenso ou autoconsciente, isso será muito difícil. Se estiver tenso o fôlego pára no seu diafragma. Quase todo mundo pára a respiração no diafragma e tenta forçá-la a partir dai. Livrar-se deste artifício é um grande problema no inicio do aprendizado do susokkan.
No inicio do zazen uma valiosa ajuda é respirar por 10 vezes. Para libertar-se da autoconsciência, chegue ao ponto final de sua respiração da forma mais quieta possível. Então trabalhará lentamente focando e usando seu tanden.
Quando o ar sai:
Comece a contar do um ao dez. Uma contagem para cada saída de ar.
Conforme solta o ar, conte:
Uuuuuuuuuuuuuuuumm .
Doooooooooooooiiiiiiiiss .
Trêêêêêêêêêêêêêêêêss.

Mantenha a contagem até dez e então retorne ao um novamente. Isto é o susokkan.
Enquanto conta sua respiração, se concentra nela constantemente. É importante seguir sua respiração com sua concentração. Seguindo sua respiração, cuidadosamente sua concentração aumenta. Por estar totalmente concentrado, mesmo que olhe ao meio externo a você, não será tocado por ele, uma vez que sua concentração na respiração e contagem não deixam o mundo externo interferir. Mesmo que haja sons, aromas, sabores ou qualquer estimulo externo ao seu redor, se sua concentração é profunda você inflexivelmente observa. Assim deve ser com os sentimentos e especialmente com os pensamentos neste ou naquele assunto. Estes pensamentos também reduzirão muito.
Lembre-ser:
Atenção plena em sua respiração e na contagem. Da forma como o Sexto Patriarca disse:

Desunam-se de todo os estímulos externos e não sejam perturbados por eles.
Esta separação ocorre conjuntamente com o susokkan. Você se torna desligado do mundo externo com seus sons e imagens. Deste modo sua mente se torna livre da ligação com os pensamentos. Então, se encontrará no atento, verdadeiro e altamente desenvolvido estado da mente.
Daruma Daishi falou:
Não se preocupe com coisas externas; se não tiver problemas no interior, a mente será como uma muralha que poderá ao mesmo tempo estar no Tao (verdade, caminho).
Isto não significa ficar tenso e oprimido durante a respiração Quer dizer chegar ao final de cada inspiração ou expiração e não ser levado pelo meio externo. Deste modo, não há espaço para nada ser encontrado — nenhum indício, nenhuma brecha. Este é o universo do zazen, o mundo do samadhi. de Buda.
Hakuin ensinou:
Comece realizando o susokkan, o melhor caminho possível para entrar no samadhi profundo, focando em seu ki e em seu tanden.
No início, o susokkan pode gerar desconfiança e parecer incerto, mas é importante não parar e persistir. Uma vez que você principia seu esforço, precisa caminhar até o final. Por isso, o osesshin é o melhor momento.
Quase todas as pessoas que participarem de dois ou três osseshins dominarão o susokkan. Qualquer um está apto a aprendê-lo plenamente.
Avaliar quão longe podemos chegar ao usar este susokkan em nossa vida diária, depende do esforço de cada um. Entretanto, se vivemos em sociedade leiga treinar de forma interrompida torna muito difícil dominar o susokkan. A prática é melhor efetivada se ocorrer com regularidade.
Susokkan é o ponto da prática que pode ser aprendido em curto tempo. Uma vez que o domine e o faça por si só, não esquecerá mais. Se este exercício estiver maduro, sentirá o sabor deste estado profundo e não o esquecerá.
Mesmo que o susokkan pareça duvidoso e sem poder a primeira vista, se trabalhar pacientemente e com sinceridade nisto, pouco a pouco seu fôlego minuciosamente virá de seu abdome. Após exalar por completo, permitirá a expansão do abdome em sua frente. Repita este processo muitas vezes. No começo do zazen repita sempre. Após isso não coloque nenhum esforço. Deixe mover simplesmente.
Embora no princípio seu fôlego pareça superficial, de fato, se observar e compará-lo com sua respiração do dia-a-dia, verá que é muito mais profundo. Se praticar muito, conseguirá progredir na técnica completamente. Deste abdome supostamente não desenvolvido surgirá um ki forte e cheio de energia.
É fácil acontecerem dispersões e ki crescer na parte superior do corpo. Com o treino regular do susokkan, o ki pode ser tranquilamente recolhido ao tanden e ser sentido como força e energia. Você não pode obter artificialmente um ki forte. Se tentar forçá-lo, ele encerrará em seu diafragma e seu fôlego ficará mais curto e difícil. Tem de chegar nele com esforço paciente.
Aqui Hakuin ensinou:
Inicie com o susokkan, a melhor forma possível de atingir o samadhi, focando seu ki e seu tanden. Então, concentre-se intensamente em seu Koan até que rompa as raízes da atenção em sua autoconsciência completamente.
Seus lugares internos e seu pensamento profundo se tornarão totalmente preenchidos. Seu abdome ficará repleto de energia. Quando você estiver neste estado de consciência, pode pela primeira vez desenvolver o seu koan. Contudo não há problemas se não trabalhar um koan. Pessoas experientes relataram ser possível alcançar a iluminação sem um koan.
Do interior de si mesmo, atente cuidadosamente ao local onde sua respiração surge.
Observe este ponto com cuidado.
Observe cada ponto do qual a respiração nasce. Deste modo, com a pergunta "O que é isso? "O que é isso? "O que é isso?" o veja completamente. Este ki renasce constantemente renovado e nunca se esgota; nunca foge. Vindo do ki, surge uma respiração apos outra:
Observando atentamente a fonte de origem, foque sua consciência e concentração na questão: "O que é isso?”.
No princípio enumere. Entretanto após a respiração se tornar correta e cheia, a contagem pode cessar. Com o fluxo completo do ki faça a pergunta: “O que é isso?" Com esta concentração você se separa do exterior. Você se encontrará constantemente na direção da fonte de sua respiração. Mantendo-se assim, se suprimirá e mergulhará nisto. Se fizer isso sinceramente, perderá quase por completo qualquer vestígio do mundo externo. Sua própria mente não terá pensamentos externos, apenas as incursões de ar virão uma após a outra, até que se perca a consciência da pergunta: “O que é isso?". Se flagrar-se neste estado, nunca mais perderá esta sensação. .
Seu estado de mente verdadeiramente se expande. .Esta consciência repleta é como um profundo, um profundo oceano, porém não como um buraco negro. Neste estado de clara transparência será envolto por uma iluminação total e reluzente. Mesmo a consciência do presente é quase completamente perdida e só a sensação de estrita plenitude sobra.
Este estado de mente aprofunda e aprofunda e finalmente aumenta muito, e também se reduz completamente. Isto é conhecido como ignorar as origens das raízes ocultas. É sobre isso que Hakuin estava falando quando orientou:
Depois, concentre-se intensamente em seu koan até desenterrar as raízes de sua autoconsciência completamente.
Primeiro rompa as origens e apenas após, poderá vivenciar o mesmo estado de consciência que Buda foi capaz de compreender e que naquele tempo, pela primeira vez surgiu fazendo a consciência renascer. A cada instante ele viu a estrela da manhã e soube que aquele mundo, dentro do qual penetrou, não diferia em nada de sua própria natureza.
O ultimo ponto do zazen não é a morte e sim uma iluminação repleta e verdadeiramente arguta, da qual vem a pureza da vida. Em relação ao mundo exterior, é como um renascimento completo. Esta energia renascida tem muita força e se amplia ao mundo exterior também. Esta foi a provação que Buda descreveu. Esta é a mente real, a mente original que ele conseguiu reconhecer.
A mente natural esta clara neste ponto, o exato ponto da fonte da verdadeira mente. O que ainda não estiver com um correto funcionamento acordará ao mundo externo, e como algo simples se adequará se for estimulado e trabalhado com destreza. Este ponto a partir do qual a mente começa a funcionar tem suma importância. Se esta função não se originar, o significado da experiência morre e o zazen se torna lentamente desmotivado.
Quando esta novíssima e vigorosa consciência renasce da prática, quando você acordar para a vida real, se tornará um Buda. Isto ocorre não apenas durante o samadhi, mas na essência do kensho. Com ele vem o instante mais importante do Zen e do Buddhadharma.
Sim, apenas quando houver a expansão da mente ao exterior, a realidade do conhecimento terá significado. Por isso, não podemos ter pressa. É uma questão de sabermos até onde podemos ir ao aprimoramento de nossa energia plena e perfeita. É o absoluto. Por realizarmos isto inseridos num contexto de turbulências e estimulações exteriores, se praticarmos com alvoroço estaremos provando que não estamos desvinculados das ações externas. Fazer isso com plenitude é de máxima importância. Praticar este estado, não importando quão longínquo esteja, é objetivo final do zazen.
Hakuin concluiu:
Se você, enfim, continuar praticando o zazen dia após dia, kensho acontecerá tão certamente como estar no chão em que pisa. Ponha tudo que tem na prática.
Ele contou que não importa quantos anos você precisa se esforçar, nem quantos meses ou dias serão necessários. Desenvolverá de acordo com a energia e esforço de cada um. Depende do poder de concentração individual. Não há como calcular. Não pode ser dito. Contudo, ao praticarmos por muitas horas chegaremos ao resultado.
Nossa meta é o renascimento total de nossa consciência. Estar em direção a este objetivo com toda nossa energia é o que deve fazer. Mesmo que se esforce e não atinja o propósito, será como palpar o chão com as mãos. Sem fracassos, a iluminação pode ser alcançada. Podemos, com certeza, chegar à iluminação. Hakuin nos ensinou como, através de sua própria experiência. Qualquer um, todos nós, podemos realizar o kensho. Qualquer um pode chegar a este estado da mente e qualquer um pode renascer deste estado de mente. Baseado neste caminho, Hakuin nos ensinou.



Traduzido para o português por Franco, C. B.. Baseado em Morning Dewdrops of the Mind de Shodo Harada Roshi, traduzido do japonês para o inglês por Priscilla Daichi (Berkeley, Calif.: North Atlantic Books/Frog Ltd., 1993). Direitos reservados (c) 1993 de Shodo Harada Roshi. Direitos reservados da tradução (c) 1993 de Priscilla Storandt. Uso com permissão.